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Uso de pioglitazona a longo prazo em pacientes com MASLD

Introdução

A Doença Hepática Gordurosa Associada à Disfunção Metabólica (MASLD) é um problema de saúde pública global, afetando cerca de 30% da população ocidental, com prevalências ainda maiores na América Latina. O manejo da doença é um desafio, sobretudo diante do alto custo e limitada disponibilidade de novas terapias.

A pioglitazona, agonista do receptor PPAR-γ, apresenta efeitos comprovados na melhora da resistência insulínica, redistribuição lipídica e redução da inflamação hepática.

Apesar dos avanços recentes, como o desenvolvimento de moléculas inovadoras – a exemplo do resmetirom e dos agonistas de GLP-1 – o acesso a esses fármacos permanece restrito, principalmente em países de média e baixa renda, devido ao custo elevado e à limitada disponibilidade nos sistemas públicos de saúde.

Nesse cenário, a pioglitazona se destaca como uma opção já estabelecida e acessível, com mecanismos de ação que atuam diretamente nos pilares fisiopatológicos da MASLD: melhora da resistência insulínica, redistribuição do tecido adiposo e redução da inflamação hepática. Esses efeitos, combinados, têm potencial para não apenas conter a progressão da doença, mas também melhorar parâmetros metabólicos associados, oferecendo uma abordagem integrada e de impacto clínico relevante. No entanto, seu papel em uso prolongado em pacientes com MASLD ainda carecia de dados em cenários reais brasileiros.

Metodologia

Pereira et al. conduziram estudo retrospectivo multicêntrico que avaliou pacientes com MASLD, acompanhados em três hospitais públicos no Brasil, tratados com pioglitazona 30–45 mg/dia por até 10 anos.

Critérios de inclusão: pacientes ≥18 anos, uso mínimo de 1 ano de pioglitazona e disponibilidade de elastografia hepática antes e após tratamento.
Critérios de exclusão: pacientes com condições que pudessem comprometer a acurácia da elastografia, ou seja; colestase grave (bilirrubina total > 5 mg/dL), elevação de enzimas hepáticas acima de cinco vezes o limite superior da normalidade, ascite avançada, processos inflamatórios ou infecciosos agudos (colangite), ingestão alimentar nas duas a quatro horas anteriores ao exame, congestão hepática decorrente de insuficiência cardíaca, presença de lesões focais na região de medição ou dificuldades técnicas relacionadas à baixa cooperação.
Variáveis analisadas: dados demográficos, antropométricos e clínicos, incluindo idade, sexo, altura, peso, Índice de Massa Corporal (IMC), presença de DM2 (diabetes mellitus tipo 2), dislipidemia, Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS), escore FIB-4 e FAST™, uso de losartana e estatinas. Os exames bioquímicos séricos realizados em todos os pacientes incluíram plaquetas, Alanina Aminotransferase (ALT), Aspartato Aminotransferase (AST), Gama-Glutamil Transferase (GGT), Colesterol total, HDL e LDL. A Medição da Rigidez Hepática (Liver Stiffness Measurement LSM) por Elastografia Transitória Controlada por Vibração (VCTE) e a CAP (Parâmetro de Atenuação Controlada) foram medidas usando aparelhos FibroScan®.
Desfecho primário: variação do escore FibroScan-AST- FAST™ score (marcador não invasivo de risco de MASLD).
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Os pacientes foram estratificados em dois grupos: 1–3 anos e 4–10 anos de tratamento.
Pacientes receberam pioglitazona para tratar MASLD associada ao diabetes tipo 2 ou para aqueles cuja biópsia hepática demonstrou fibrose de grau ≥F2.


Resultados
O estudo incluiu um total de 65 pacientes, dos quais 39 (60%) eram do sexo feminino.
Um total de 37 pacientes receberam pioglitazona por 1 a 3 anos e 28 pacientes receberam pioglitazona por 4 a 10 anos. A idade média da coorte foi de 58 ± 10,23 anos. No momento da inclusão, 50 (74%) dos pacientes apresentavam hipertensão arterial sistêmica (HAS), 48 (74%) tinham diabetes mellitus tipo 2 (DM2) e 47 (69%) dislipidemia. Em relação à terapêutica, 10 pacientes (15,4%) utilizavam insulina, enquanto 55 (84,6%) estavam em tratamento com metformina e 8 (12,3%) em tratamento com agonistas do receptor de GLP-1. Adicionalmente, 31 (46%) dos participantes recebiam losartana e 41 (60%) estatinas.


Os resultados encontrados estão na Figura 1 e são resumidos abaixo:
A análise longitudinal dos parâmetros de saúde desde o início do estudo até 1 a 3 anos e 4 a 10 anos revela alterações significativas nos principais biomarcadores, indicando melhorias nas enzimas hepáticas, esteatose hepática e controle glicêmico ao longo do tempo (Fig. 1).
Redução significativa na pontuação FAST™ foi observada entre o início do estudo e o período de acompanhamento de 1 a 3 anos (p = 0,042), sendo ainda mais pronunciada no período de acompanhamento de 4 a 10 anos (p = 0,012).
Os parâmetros da CAP apresentaram redução significativa apenas entre o período basal e o período de acompanhamento de 4 a 10 anos (p = 0,002), sugerindo uma diminuição no acúmulo de gordura hepática a longo prazo.
Melhora no controle glicêmico no período de 4 a 10 anos, destacando o duplo benefício da pioglitazona no tratamento de disfunções metabólicas e hepáticas.
Dislipidemia apresentou uma tendência a maiores chances de redução da LSM, porém sem significância estatística..
Segurança: A descontinuação esteve relacionada à falta de disponibilidade do fármaco no sistema público, e não a efeitos adversos.

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