A constipação intestinal é uma queixa comum que afeta até 15% da população em geral, e seu manejo inicial inclui aconselhamento dietético e de estilo de vida, suplementação de fibras, e se necessário terapia laxativa. Pacientes com constipação leve podem apresentar melhora apenas com modificações de dieta e hábitos de vida, isoladamente ou associadas a laxantes formadores de massa muscular, como psyllium ou metilcelulose. Enquanto aqueles com sintomas persistentes podem necessitar de laxantes osmóticos ou estimulantes, e em alguns casos de medicamentos prescritos como secretagogos. O objetivo do manejo não é necessariamente alcançar evacuações diárias, mas sim melhorar os sintomas que incomodam o paciente, como sensação de evacuação incompleta ou fezes duras e granulosas.1
O polietilenoglicol (PEG) é um polímero de óxido de etileno de cadeia longa que atua como laxante osmótico, ou seja, retendo a água no lúmen intestinal aumentando o conteúdo hídrico das fezes, no qual melhora sua consistência e facilita a evacuação. Inúmeros estudos conduzidos em pacientes com constipação crônica demonstraram que o PEG, com ou sem eletrólitos, aumenta significativamente o número de evacuações espontâneas em comparação ao placebo, melhora sintomas como esforço evacuatório e consistência das fezes.2,3
Diversas diretrizes reconhecem o PEG como opção de destaque no manejo da constipação em diferentes populações, incluindo adultos, crianças e gestantes. É indicado como agente osmótico de baixo custo pela American Gastroenterological Association (AGA), recomendado para o tratamento da constipação intestinal crônica pela Organização Mundial de Gastroenterologia (WGO), e apontado por consenso europeu como laxativo preferencial durante a gravidez.4-6
Adicionalmente, de acordo com o Guia Prático de Orientação de Constipação Intestinal da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), o PEG é considerado o medicamento de primeira escolha para o tratamento da constipação intestinal funcional em crianças.7
Comparação do PEG com e sem eletrólitos
O PEG está disponível em formulações de diferentes tamanhos com um peso molecular médio aproximado de 3350 ou 4000 g/mol, em formulações com adição de eletrólitos (PEG + E) ou sem eletrólitos (PEG). O PEG + E foi utilizado inicialmente em altas doses para preparo intestinal antes de colonoscopias ou cirurgias intestinais, sendo administrado com eletrólitos para reduzir o risco de desequilíbrios hidroeletrolíticos, podendo conter sódio, potássio ou cloreto. Já o PEG sem eletrólitos foi desenvolvido posteriormente em doses mais baixas para tratamento da constipação, com o objetivo de diminuir a carga de sódio, melhorar o sabor e potencialmente favorecer a aceitação e a adesão dos pacientes.8
Diante da eficácia consolidada do PEG no manejo da constipação, a revisão sistemática e meta-análise em rede conduzida por Katelaris P, et al., (2016)8, teve como objetivo avaliar a eficácia relativa do PEG + E ou PEG via oral no tratamento da constipação intestinal funcional em adultos.8
Os estudos selecionados para a revisão continham comparadores como, placebo, lactulose, laxativos formadores de massa, agonistas da serotonina (5-HT4), além de comparações diretas entre PEG + E e PEG. O desfecho primário foi a variação no número médio de evacuações por semana, e os desfechos secundários abrangeram segurança, tolerabilidade, adesão e aceitação do tratamento.8
Resultados
O estudo incluiu adultos com constipação funcional, incluindo casos de constipação crônica idiopática, associada a medicamentos, síndrome do intestino irritável ou doenças como Parkinson. No total foram incluídos 2247 pacientes, dos quais participaram de 19 ensaios clínicos randomizados (PEG N = 9, PEG + E N = 8, PEG versus PEG + E N = 2) avaliados, conforme Figura 1 mostrando um total de 26 conexões entre os comparadores.8
Figura 1: Rede formada por intervenções e suas comparações diretas.8
Os resultados mostraram que ambos, PEG + E ou PEG, aumentaram significativamente a frequência de evacuações por semana em comparação aos comparadores, sendo 1,8 (95% Crl 1,0, 2,8) e 1,9 (95% Crl 0,9, 3,0), respectivamente, versus o placebo, e em 1,8 (95% Crl 0,0, 3,5) e 1,9 (95% Crl 0,2, 3,6), respectivamente, versus lactulose. A comparação direta entre PEG + E e PEG não demonstrou diferença significativa na eficácia (−0,5; 95% Crl −4,5 a 3,3), conforme mostrado na Figura 2. Achado confirmado também pela análise em rede, que apontou diferença média insignificante entre PEG + E e PEG (0,1; 95% Crl −1,1 a 1,2) no número de evacuações por semana (Figura 3).8
Figura 2: Diferença média nos movimentos intestinais semanais PEG+E vs PEG (estudos comparativos).8
Figura 3: Comparações em pares para PEG e PEG+E da meta-análise de rede.8
Quanto à segurança e tolerabilidade, ambos foram considerados seguros, com eventos adversos geralmente leves a moderados. Onze pacientes (1,8%) descontinuaram o tratamento devido a eventos adversos com PEG + E, em comparação com três pacientes (0,4%) com PEG. Os motivos para a descontinuação com PEG + E incluíram dor abdominal, rigidez abdominal, distensão abdominal, náusea, diarreia, fissura anal e paladar ruim. Os motivos para a descontinuação com PEG foram dor e distensão abdominal. Houve apenas um caso isolado de hipocalemia que foi relatado em paciente que usava PEG + E associado a diurético.
Nos dados referentes à adesão e disposição para continuar a terapia, a comparação direta entre PEG e PEG + E mostrou que mais pacientes estavam dispostos a continuar com a terapia com PEG (85% vs. 63%), mas essa diferença não foi estatisticamente significativa (p = 0,07). Relatos de menor aceitação do sabor com PEG + E sugerem possível impacto na adesão ao tratamento.8
Conclusão
Tratando-se de um sintoma gastrointestinal comum e um relevante problema de saúde, a constipação funcional é capaz de comprometer a qualidade de vida e aumentar a demanda por recursos de saúde. Nesse contexto o PEG destaca-se como laxante osmótico eficaz e seguro, recomendado por diretrizes internacionais e nacionais.8
O estudo confirma que tanto o PEG quanto o PEG + E são opções eficazes e seguras para o manejo da constipação em adultos. A adição de eletrólitos neste contexto clínico não parece oferecer benefícios adicionais e pode reduzir a aceitação devido ao sabor, impactando a adesão ao tratamento.8
Referencias
- Wald A, Rao SC. Management of chronic constipation in adults. In: Talley NJ, Hussain Z, Robson KM, editors. UpToDate 2025 [acesso em 8 set. 2025]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/management-of-chronic-constipation-in-adults?search=polyethylene%20glycol%20(PEG)%20for%20constipation&source=search_result&selectedTitle=1~150&usage_type=default&display_rank=1#H30890925
- Chang L, Chey WD, Imdad A, Almario CV, Bharucha AE, Diem S, Greer KB, Hanson B, Harris LA, Ko C, Murad MH, Patel A, Shah ED, Lembo AJ, Sultan S. American Gastroenterological Association-American College of Gastroenterology Clinical Practice Guideline: Pharmacological Management of Chronic Idiopathic Constipation. 2023 Jun;164(7):1086-1106.
- Chang L, Sultan S, Lembo A, Verne GN, Smalley W, Heidelbaugh JJ. AGA Clinical Practice Guideline on the Pharmacological Management of Irritable Bowel Syndrome With Constipation. 2022 Jul;163(1):118-136.
- American Gastroenterological Association; Bharucha AE, Dorn SD, Lembo A, Pressman A. American Gastroenterological Association medical position statement on constipation. 2013 Jan;144(1):211-7.
- WORLD GASTROENTEROLOGY ORGANISATION (WGO). Constipação: uma perspectiva mundial. Prática clínica. Novembro de 2010. Disponível em: https://www.worldgastroenterology.org/UserFiles/file/guidelines/constipation-portuguese-2010.pdf.
- Tytgat GN, Heading RC, Müller-Lissner S, Kamm MA, Schölmerich J, Berstad A, et al. Contemporary understanding and management of constipation in the general population and pregnancy: consensus meeting. Aliment Pharmacol Ther. 2003;18:291-301.
- Sociedade Brasileira de Pediatria. Constipação intestinal: guia prático, nº 144, 04 de abril de 2024.
- Katelaris P, Naganathan V, Liu K, Krassas G, Gullotta J. Comparison of the effectiveness of polyethylene glycol with and without electrolytes in constipation: a systematic review and network meta-analysis. BMC Gastroenterol. 2016 Mar 31;16:42.