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Efeitos terapêuticos do Xilitol para a Rinossinusite crônica (RSC)

A rinossinusite crônica (RSC) é uma condição inflamatória da mucosa da cavidade nasal e seios paranasais com duração superior a 12 semanas. Na sinusite crônica a presença bacteriana interfere na depuração mucociliar, na imunidade inata e celular. A relação entre RSC e biofilmes foi descrita em 2004 e várias terapias têm sido propostas para erradicar essas entidades, visando o controle adequado dos sintomas e redução da gravidade da doença. Entre os vários tratamentos atualmente recomendados, destacam-se: corticoides nasais, implantes com corticoides intranasais, corticoides sistêmicos, lavagem nasal e imunoterapia1.

A lavagem nasal é comumente recomendada, tanto no pré quanto no pós-operatório, para melhorar a depuração mucociliar, diminuir o edema, reduzir a concentração de mediadores inflamatórios e reduzir a quantidade de muco acumulado nas cavidades, além de prevenir a formação de crostas. Estudos recentes têm demonstrado a eficácia do aditivo xilitol associado à irrigação nasal no pós-operatório, devido às suas características antibacterianas, bactericidas e antiadesivas demonstradas in vitro1.

O xilitol é um álcool de açúcar com cinco carbonos que existe naturalmente em muitas frutas e vegetais e é amplamente utilizado na indústria de alimentos como adoçante. Ele ganhou ampla atenção na década passada como um agente antibacteriano natural e, mais recentemente, como um agente antibiofilme2.

No sistema respiratório, o xilitol pode fornecer efeitos terapêuticos, como a toxicidade bacteriana, onde a molécula de xilitol não é metabolizada pela bactéria e deve ser eliminada da célula. Isso promove um ciclo de gasto energético sem ganho nutricional que, juntamente com o acúmulo tóxico de fosfato de xilitol no interior da célula, desencadeia a morte bacteriana. Além do mais, o xilitol extracelular age como um receptor análogo para a célula hospedeira, interferindo no processo de adesão bacteriana.

Hardcastle, et al. (2017)3 conduziram um estudo em que amostras de muco úmido foram removidas endoscopicamente de 30 pacientes com RSC durante a cirurgia endoscópica nasal (FESS). Alíquotas de 0,5 ml de cada tratamento (alfadornase, Xilitol e solução salina) foram aplicadas duas vezes em uma amostra de 0,5 ml de muco em um período de 24 horas. Os resultados mostraram que o xilitol reduziu a viscoelasticidade do muco úmido significativamente mais do que o controle salino. O xilitol diminuiu significativamente a definição da borda da crosta mucosa em relação à solução salina (figura 1 e 2). Sendo assim, o xilitol pode ser um mucolítico eficaz, estimulando a quebra das crostas mucosas pós-operatórias e a redução da viscoelasticidade e da viscosidade do muco úmido.

Figura 1. Crosta de muco tratada com solução salina às 0 horas (pré-tratamento) (canto superior esquerdo), 4 horas (canto superior direito), 8 horas (canto inferior esquerdo) e 24 horas (canto inferior direito)

Figura 2. Crosta de muco tratada com xilitol às 0 horas (pré-tratamento) (canto superior esquerdo), 4 horas (canto superior direito), 8 horas (canto inferior esquerdo) e 24 horas (canto inferior direito).

Lin, L et al. (2017)4 realizaram um estudo randomizado, controlado, duplo cego e paralelo com 30 pacientes com rinossinusite crônica (RSC). Os pacientes foram tratados com xilitol 5% (XNI, grupo XNI) ou irrigação nasal com solução salina (SNI, grupo SNI) por 30 dias, após os quais seus sintomas foram reavaliados usando Escala Visual Analógica (VAS) e Sino-Nasal Outcome Test 22 (SNOT-22. Resultados mostraram que os escores de VAS e SNOT-22 foram reduzidos significativamente (P < 0,001), após o tratamento com XNI, mas não após o SNI. Além disso, houve diferenças estatísticas nas avaliações de EVA e SNOT-22 e no conteúdo de NO nasal no seio maxilar direito entre os dois grupos.

Em um estudo prospectivo, randomizado, controlado, duplo cego e cruzado realizado por Weissman, JD et al. (2017)5 20 pacientes foram instruídos a realizar cursos sequenciais de 10 dias de irrigações diárias com xilitol 5% e solução salina de forma aleatória, com um período de descanso de irrigação de 3 dias no início de cada braço de tratamento. Os dados coletados incluíram características do paciente, juntamente com as pontuações do Sino-Nasal Outcome Test 20 (SNOT-20) e da Escala Visual Analógica (VAS) relatadas no início e no final de cada ciclo de irrigação. Resultados mostraram que houve uma redução significativa na pontuação SNOT-20 durante a fase de irrigação com xilitol (queda média de 2,43 pontos) em comparação com a fase salina (aumento médio de 3,93 pontos), indicando melhora dos sintomas nasossinusais (P = 0,0437). Não houve diferença nos escores VAS.

Kim, DH et al. (2019)6 realizaram um estudo duplo-cego, randomizado, cruzado e controlado com 100 pacientes com doença nasossinusal submetidos à cirurgia endoscópica dos seios da face (ESS), septoplastia ou ambas concomitantemente. Os sintomas nasais foram avaliados com o NOSE (Nasal Obstrução Sintomas Avaliação) e SNOT-20 (Sino-Nasal Outcome Test-20) e através dos escores da escala visual analógica (VAS). Resultados mostraram que no grupo ESS (n = 34), a pontuação geral dos sintomas nasais avaliada pelo SNOT-20 mostrou melhora significativamente maior no grupo xilitol versus o grupo solução salina (P = 0,022). Os escores de sintomas da VAS para espirros (P = 0,003), dor de cabeça (P = 0,02) e dor facial (P = 0,037) também melhoraram mais no grupo do xilitol. No grupo da septoplastia (n = 39), a pontuação VAS para congestão nasal mostrou uma melhora significativamente maior no grupo do xilitol quando comparado ao grupo de irrigação com solução salina (P = 0,001). A pesquisa de preferência mostrou que mais da metade dos pacientes em cada grupo cirúrgico preferia a irrigação com xilitol.

Silva, et al. (2022)1 conduziram um estudo prospectivo de intervenção não controlada com 52 pacientes diagnosticados com RSC e os dividiram em dois grupos (n = 26 no grupo “Xilitol 1,67%” e n = 26 no grupo “Solução Salina”). Resultados mostraram que o grupo de pacientes que utilizou solução de xilitol no pós-operatório de cirurgia endoscópica endonasal apresentou melhora significativa dos sintomas álgicos (através da avaliação da escala visual analógica) (P < 0,001) e dos sintomas nasais (através da pontuação nos questionários NOSE (P < 0,002)  e SNOT-22 (P < 0,001)).  .

Em uma publicação recente na European Position Paper on Rhinosinusitis and Nasal Polyps (EPOS) 20202, foi elucidado a ação da molécula xilitol, esclarecendo que o açúcar diminui a concentração de sal do líquido da superfície das vias aéreas humanas que contém muitas substâncias antimicrobianas, com potencial para a melhoria do sistema imunológico inato e, assim, previnindo infecções das vias aéreas. Além disso, através da interrupção do transporte da parede celular da glicose e da glicólise intracelular, o xilitol pode inibir o crescimento bacteriano. O grupo diretor da EPOS recomenda o uso de irrigação salina nasal com adição de xilitol.

O European Forum for Research & Education in Allergy & Airway Diseases (EUFOREA) 20237 desenvolveu recentemente em colaboração com os principais líderes de opinião globais no campo das doenças das vias respiratórias inflamatórias crônicas, um guia de bolso (figura 3) com um novo algoritmo de tratamento com o objetivo de agilizar o acesso ao diagnóstico e tratamento da RSC. O algoritmo é baseado nos documentos EPOS 2020 e ICAR 2021 e projetado para uso na vida real. Vale destacar, que a solução salina esta presente em todas as etapas de tratamento e o xilitol é indicado mesmo para casos graves.

Figura 3: Algoritmo de tratamento do guia de bolso EUFOREA RSC. AB: Antibióticos; EUFOREA: Fórum Europeu para Investigação e Educação em Alergias e Doenças das Vias Aéreas; EVA: escala visual analógica.

No contexto desafiador do tratamento da RSC, é comum a associação de diversas abordagens terapêuticas. A utilização de aditivos como o xilitol na lavagem nasal surge como uma abordagem promissora, proporcionando benefícios significativos na redução dos sintomas e na melhoria da qualidade de vida dos pacientes afetados. Em consonância com as diretrizes recentes da EPOS 2020 e do EUFOREA 2023, o uso do xilitol apresenta não apenas eficácia, mas também segurança e tolerabilidade, reforçando sua posição como uma opção terapêutica viável e recomendada para pacientes com rinossinusite crônica.

 

Referências Bibliográficas

  1. Silva CFFSD, Silva FERD, Pauna HF, Hurtado JGGM, Dos Santos MCJ. Symptom assessment after nasal irrigation with xylitol in the postoperative period of endonasal endoscopic surgery. Braz J Otorhinolaryngol. 2022 Mar-Apr;88(2):243-250.
  2. Fokkens WJ, et al. European Position Paper on Rhinosinusitis and Nasal Polyps 2020. 2020 Feb 20;58(Suppl S29):1-464.
  3. Hardcastle T, et al. The in vitro mucolytic effect of xylitol and dornase alfa on chronic rhinosinusitis mucus. Int Forum Allergy Rhinol. 2017 Sep;7(9):889-896
  4. Lin L, Tang X, Wei J, Dai F, Sun G. Xylitol nasal irrigation in the treatment of chronic rhinosinusitis. Am J Otolaryngol. 2017;38:383-9.
  5. Weissman JD, Fernandez F, Hwang PH. Xylitol nasal irrigation in the management of chronic rhinosinusitis: a pilot study. The Laryngoscope. 2011;121:2468-72.
  6. Kim DH, Kim Y, Lim IG, Cho JH, Park YJ, Kim SW, Kim SW. Effect of Postoperative Xylitol Nasal Irrigation on Patients with Sinonasal Diseases. Otolaryngol Head Neck Surg. 2019 Mar;160(3):550-555.
  7. Hellings PW, et al. The EUFOREA pocket guide for chronic rhinosinusitis. Rhinology. 2023 Feb 1;61(1):85-89.
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