A orientação clássica da Organização Mundial da Saúde (OMS/WHO) recomenda a suplementação diária de 1500 mg, divididos em três doses, para gestantes em populações com baixa ingestão dietética de cálcio, visando reduzir o risco de pré-eclâmpsia. Contudo, o limite de 500mg por refeição e a intolerância das pacientes são desafios para a rotina clínica.
Uma robusta publicação do conceituado New England Journal of Medicine, intitulado "Two Randomized Trials of Low-Dose Calcium Supplementation in Pregnancy"1, procurou avaliar o tema. Nele, pesquisadores conduziram ensaios clínicos independentes, randomizados, duplo-cegos e de não inferioridade totalizando 22.000 gestantes nulíparas na Índia e na Tanzânia, comparando a suplementação de cálcio em baixa dose (500 mg diários) com alta dose (1500 mg diários).
Os resultados revelaram que a dose menor de cálcio não foi inferior à dose mais elevada em relação ao risco de pré-eclâmpsia. A incidência acumulada de pré-eclâmpsia foi de 3,0% no grupo de 500 mg e 3,6% no grupo de 1500 mg na Índia a (risco relativo, 0,84; intervalo de confiança [IC] de 95%, 0,68 a 1,03), e 3,0% e 2,7%, respectivamente, na Tanzânia (risco relativo, 1,10; IC 95%, 0,88 a 1,36). Quanto ao desfecho de parto prematuro, as taxas foram de 11,4% no grupo de 500 mg e 12,8% no grupo de 1500 mg na Índia (risco relativo, 0,89; IC de 95%, 0,80 a 0,98), e 10,4% e 9,7%, respectivamente, na Tanzânia (risco relativo, 1,07; IC 95%, 0,95 a 1,21).
Esses achados sugerem que a suplementação de cálcio em baixa dose pode ser uma alternativa eficaz, especialmente em populações com baixa ingestão dietética de cálcio, proporcionando benefícios semelhantes na prevenção de pré-eclâmpsia com uma carga menor de comprimidos e custos potencialmente reduzidos.
Tais resultados estão condizentes com uma meta-análise anterior (2022) publicada no BJOG, intitulado “Calcium for pre-eclampsia prevention: A systematic review and network meta-analysis to guide personalised antenatal care”2. A revisão analisou 30 ensaios clínicos envolvendo um total de 20.445 gestantes, inovando ao comparar a eficácia de altas (1 grama ou mais) e baixas doses de cálcio para a prevenção de pré-eclâmpsia. Sua conclusão foi que a suplementação de cálcio, tanto em doses altas quanto baixas, preveniu a pré-eclâmpsia de forma semelhante. A eficácia do cálcio foi consistente, independentemente do risco basal da doença, coadministração de vitamina ou momento do início da intervenção.
Tais iniciativas podem colaborar com uma maior adesão das gestantes a suplementação de cálcio, principalmente entre países com ingestão cerca de 50% abaixo da recomendada, como no Brasil³. Continuaremos acompanhando as publicações sobre o tema, assim como a atualização dos guidelines.
Referências
- Dwarkanath P, Muhihi A, Sudfeld CR, Wylie BJ, Wang M, Perumal N, Thomas T, Kinyogoli SM, Bakari M, Fernandez R, Raj JM, Swai NO, Buggi N, Shobha R, Sando MM, Duggan CP, Masanja HM, Kurpad AV, Pembe AB, Fawzi WW. Two Randomized Trials of Low-Dose Calcium Supplementation in Pregnancy. N Engl J Med. 2024 Jan 11;390(2):143-153.
- Woo Kinshella ML, Sarr C, Sandhu A, Bone JN, Vidler M, Moore SE, Elango R, Cormick G, Belizan JM, Hofmeyr GJ, Magee LA, von Dadelszen P; PRECISE Network. Calcium for pre-eclampsia prevention: A systematic review and network meta-analysis to guide personalised antenatal care. 2022 Oct;129(11):1833-1843.
- Balk EM, Adam GP, Langberg VN, Earley A, Clark P, Ebeling PR, Mithal A, Rizzoli R, Zerbini CAF, Pierroz DD, Dawson-Hughes B; International Osteoporosis Foundation Calcium Steering Committee. Global dietary calcium intake among adults: a systematic review. Osteoporos Int. 2017 Dec;28(12):3315-3324.