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Marketing médico: o que é e o que o torna diferente

Para a maioria dos médicos, a carreira é construída sobre a base sólida da ciência, da ética e da relação de confiança com o paciente. A palavra “marketing”, por outro lado, parece pertencer a um universo distinto, governado por metas comerciais e táticas de persuasão. Essa aparente incompatibilidade faz com que muitos profissionais associem qualquer esforço de comunicação à autopromoção, temendo ferir os princípios da boa prática médica.

Contudo, essa visão ignora uma verdade fundamental: na era digital, a ausência de uma comunicação médica clara e responsável cria um perigoso vácuo, rapidamente preenchido pela desinformação.

Este artigo se propõe a resolver esse dilema, desmistificando o conceito e apresentando o marketing médico como ele deve ser: uma disciplina estratégica de comunicação, voltada a educar, orientar e fortalecer o relacionamento com o paciente.

Ao mergulhar nos princípios clássicos do marketing e traduzi-los para a realidade da saúde, sempre sob as diretrizes do Conselho Federal de Medicina (CFM), veremos que é possível, e necessário, comunicar o valor do trabalho médico de forma ética, sóbria e alinhada ao propósito do cuidado.

A essência do marketing: satisfazer necessidades com valor

O marketing vai muito além da ideia de vender produtos. Ele é, antes de tudo, um processo de entendimento das necessidades humanas e de criação de valor genuíno.

Segundo Philip Kotler, considerado o “pai do marketing moderno”, o marketing é “a ciência e a arte de explorar, criar e entregar valor para satisfazer as necessidades de um mercado-alvo”. A American Marketing Association (AMA) complementa: é “a atividade e os processos para criar, comunicar, entregar e trocar ofertas que tenham valor para consumidores, clientes, parceiros e a sociedade em geral”.

Essas definições reforçam um ponto essencial: o verdadeiro marketing não é persuasão, é propósito. Seu objetivo não é “empurrar” algo ao público, mas compreender e atender de forma relevante o que as pessoas realmente precisam.

Os 4 Ps adaptados à medicina

O clássico conceito de Marketing Mixintroduzido por Neil Borden em 1948 e sistematizado por Jerome McCarthy na década de 1960 — organiza o marketing em quatro dimensões fundamentais: Produto, Preço, Praça e Promoção.

Quando adaptado à área da saúde, esses elementos ganham novos significados:

  • Produto: o serviço de saúde em si — consulta, acompanhamento, procedimento, programa de prevenção ou conteúdo educativo.

  • Preço: o valor associado ao serviço, refletindo não só custos, mas também tempo, experiência e responsabilidade.

  • Praça (Place): o espaço de acesso ao cuidado — físico (consultório, clínica, hospital) ou digital (telemedicina, site, redes sociais).

  • Promoção: o modo como o médico comunica seu valor, de forma ética e educativa, priorizando o esclarecimento e a confiança.

Esses elementos, quando equilibrados com ética, formam a base do marketing médico humanizado, centrado no paciente e alinhado à missão de cuidar.


Marketing médico: uma definição centrada no cuidado

Marketing médico é o conjunto de estratégias éticas utilizadas por profissionais e instituições de saúde para fortalecer sua reputação, comunicar seu valor de forma clara e responsável e estabelecer relações de confiança duradouras com pacientes e comunidade.

Seu objetivo principal não é atrair volume, mas conectar o paciente certo ao profissional certo, por meio de informação de qualidade, transparência e respeito mútuo.

Os quatro pilares que tornam o marketing médico único

1. Ética e regulamentação como alicerce

A comunicação médica no Brasil é regida pela Resolução CFM nº 2.336/2023, que atualiza o Manual de Publicidade Médica. Entre as novidades, o uso de imagens de “antes e depois” passou a ser permitido, desde que tenha caráter educativo, com autorização expressa do paciente e contexto informativo sobre riscos e resultados possíveis.

O foco é sempre a educação, nunca a promessa de resultado. Continua proibido o uso de linguagem sensacionalista, a comparação entre profissionais, a divulgação de especialidades não registradas e o uso de preços como forma de captação.

O marketing médico ético não busca brechas: ele usa a norma como guia de credibilidade e responsabilidade.

2. O relacionamento de confiança acima da transação

O paciente não “compra” um serviço médico; ele confia sua saúde a um profissional. Por isso, o marketing médico não deve mirar em conversões imediatas, mas em relações de longo prazo baseadas em empatia e transparência.

Estudos da McKinsey & Company apontam que a jornada do paciente é emocional e complexa, e que uma comunicação empática, desde o primeiro contato até o pós-consulta, é decisiva para fidelização e satisfação.

3. A educação como principal ferramenta estratégica

O marketing médico tem na educação sua espinha dorsal. Por meio de artigos, vídeos, lives e publicações educativas, o médico transforma conhecimento em orientação acessível. Essa abordagem, conhecida como Inbound Marketing, atrai o paciente de forma orgânica, estabelece autoridade e reduz ruído informativo.

Como destaca a Harvard Business Review, em mercados complexos, “a vantagem competitiva sustentável vem da capacidade de criar e comunicar valor real”. Na medicina, esse valor é o conhecimento ético aplicado com empatia.

4. O paciente digital no centro de tudo

O novo paciente é informado, conectado e exigente. Segundo dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), mais de 51 milhões de brasileiros têm planos de saúde e pesquisam ativamente antes de escolher um profissional.

Ignorar esse comportamento é perder espaço antes mesmo da primeira consulta. O marketing médico eficaz coloca esse paciente no centro, criando canais acessíveis, linguagem empática e presença digital responsável.

 

Aplicação prática: checklist para um marketing médico ético e eficaz

Use este checklist como guia para estruturar sua presença profissional com ética e estratégia:

  • Domine as regras do jogo: leia e compreenda o Manual de Publicidade Médica do CFM (Resolução 2.336/2023). Este é o ponto de partida inegociável.

  • Defina seu posicionamento: qual é o seu diferencial? (Ex: atendimento humanizado, foco em uma subespecialidade, uso de tecnologias específicas). Comunique isso com clareza em todos os seus canais.

  • Construa sua base digital: crie ou otimize seu site, incluindo informações claras sobre sua formação, qualificações (RQE) e áreas de atuação. Implemente um blog para publicar conteúdo educativo.

  • Planeje seu conteúdo educativo: liste as principais dúvidas que seus pacientes trazem ao consultório. Transforme cada uma delas em um artigo, vídeo ou postagem informativa, sempre com linguagem acessível e ética.

  • Escolha suas redes com estratégia: selecione uma ou duas plataformas relevantes para seu público e use-as para compartilhar conteúdo educativo e fortalecer sua reputação profissional.

  • Aprimore a experiência completa: mapeie toda a jornada do paciente (do agendamento ao pós-consulta) e busque aprimorar cada ponto de contato.

  • Monitore e evolua: acompanhe métricas básicas, leia comentários e colete feedbacks. Ajuste suas estratégias com base em resultados e nas normas vigentes.

Uma nova perspectiva sobre o marketing na medicina

O marketing médico não se trata de vender saúde, mas de promover o cuidado. É a prática de usar ferramentas de comunicação para educar, construir confiança e fortalecer o vínculo humano que sustenta a medicina.

Quando feito com ética, o marketing amplia o impacto positivo do profissional, melhora a experiência do paciente e fortalece a imagem da medicina como ciência e serviço à sociedade.

Na prática, o melhor marketing médico é a excelência comunicada com responsabilidade.

Referências bibliográficas

  1. American Marketing Association (AMA). Definition of Marketing.

  2. Borden, Neil H. The Concept of the Marketing Mix. Journal of Advertising Research, 1964.

  3. McCarthy, E. Jerome. Basic Marketing: A Managerial Approach. Richard D. Irwin, 1960.

  4. Kotler, P. & Keller, K. L. Marketing Management. 15th ed., Pearson, 2016.

  5. Kotler, P., Shalowitz, J., & Stevens, R. Strategic Marketing for Health Care Organizations. Pearson, 2008.

  6. Conselho Federal de Medicina (CFM). Manual de Publicidade Médica (Resolução nº 2.336/2023).

  7. McKinsey & Company. Marketing in Healthcare: Improving the Consumer Experience, 2023.

  8. Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Dados de beneficiários – Saúde Suplementar, 2024.

  9. Harvard Business Review. What Is Strategy? (Porter, M.E., 1996).

  10. Revista Bioética (CFM). Comunicação e responsabilidade na era digital.
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