Os oceanos são uma fonte valiosa e versátil de compostos bioativos. A importância dos organismos marinhos como fonte natural destas substâncias para saúde geral dos seres humanos está se expandindo, e os ácidos graxos, produzidos pelas algas marinhas, mostram-se como bioativos com benefícios seguros para consumo humano.
Algas marinhas como fonte de ácidos graxos essenciais
Um dos principais ácidos graxos essenciais ao nosso corpo, o ácido docosahexaenóico (DHA), conhecido como ômega-3 e associado pela maioria das pessoas ao óleo de peixe, são provenientes das algas marinhas.
Por comerem as algas, os peixes marinhos são uma fonte intermediária de DHA. No entanto, a poluição por metais pesados e a super exploração dos recursos pesqueiros marinhos comprometem a sustentabilidade desta fonte.
Desta maneira, as microalgas heterotróficas, capazes de obter energia de substâncias orgânicas simples sem precisar de luz, podem ser utilizadas como fonte alternativa de DHA aos óleos de peixe.
Os óleos de algas são fontes alternativas de ácidos graxos ômega-3
Óleos de Schizochytrium sp., Ulkenia sp. e Crypthecodinium cohnii, ricos em ácidos graxos ômega-3 de cadeia longa, foram aprovados como seguros para consumo humano após serem submetidos a vários procedimentos de avaliação de segurança. Além disso, alguns óleos de algas são ricos em DHA, o que pode ser adequado para uso em fórmulas infantis ou atuar como matéria-prima para a produção de DHA de alta pureza.
Como exemplo, tem se as algas Schizochytrium sp. que cuja rápida taxa de crescimento, independência das condições climáticas e produção de DHA (que pode chegar a quase 49% do seu teor total de gordura), são consideradas uma ótima fonte para obtenção deste ômega-3.
Funções biológicas importantes do DHA na promoção da saúde humana
O ácido docosahexaenóico está ligado a vários benefícios para a saúde em humanos, com um papel crítico na gravidez e na infância, incluindo desenvolvimento do cérebro durante a gravidez e cognitivo e visual de bebês, saúde do coração, saúde dos olhos, e uma resposta inflamatória saudável. Nos adultos contribui para a redução do risco de câncer, de doenças cardiovasculares, e manutenção da função cerebral normal e visão, assim como na prevenção do declínio cognitivo relacionado ao envelhecimento.
Potenciais benéficos do tratamento com DHA em distúrbios do neurodesenvolvimento
Os ômega-3, principalmente DHA, são necessários para o desenvolvimento e funcionamento normal do cérebro.
Em crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA), sintomas de irritabilidade e hiperatividade podem estar associados a essas disfunções cerebrais, e como os tratamentos farmacológicos podem ter efeitos adversos nestas crianças, apesar das evidências limitadas, os cuidadores/pais costumam usar suplementos como vitamina D e ácidos graxos ômega-3 para lidar com tais sintomas comportamentais.
Um estudo, publicado na revista J Steroid Biochem Mol Biol, avaliou os efeitos da administração de vitamina D e ômega-3 ou ambos nos sintomas de irritabilidade e hiperatividade, comuns em crianças com TEA. Neste estudo, os autores investigaram a eficácia das três intervenções a fim de detectar um potencial efeito benéfico do tratamento nestes comportamentos.
Crianças com TEA (2,5 a 8 anos) participaram num estudo duplo-cego de vitamina D (Grupo VID: 2.000UI/dia), ômega-3 (Grupo OM: 722mg/dia de DHA), ou ambos (Grupo VIDOM: 2000 UI/dia vitamina D + 722mg/dia DHA), e foram analisados os biomarcadores para vitamina D e índice ômega-3, no início e 12 meses após o tratamento. Os comportamentos cognitivos foram avaliados pelo método “Aberrant Behavior Checklist” de irritabilidade e hiperatividade.
Das 111 crianças que completaram a coleta de dados da linha de base, 66% completaram o estudo, e os resultados demonstraram que após 12 meses, as crianças que receberam somente OM ou VID tiveram maior redução da irritabilidade do que aquelas que receberam placebo. No artigo, os autores sugeriram que tais efeitos poderiam estar associados as propriedades anti-inflamatórias, antioxidantes, e imunomoduladoras que a vitamina D e o ômega-3 poderiam exercer no TEA.
Também, num outro estudo, publicado na revista J Autism Dev Disord, foram observaram os efeitos da suplementação de ácidos graxos ômega-3 e-6 nos sintomas do TEA em crianças nascidas prematuras, e que possuem um risco maior para o diagnóstico de TEA. Neste estudo, o foco das análises estava nos efeitos do tratamento nas habilidades de linguagem nesses crianças.
Os resultados demonstraram evidências sugestivas da eficácia da suplementação dos ácidos graxos ômega-3 e-6 na melhoria do desenvolvimento da linguagem das crianças com risco de TEA, especificamente o uso de gestos, os quais podem indicar melhorias gerais na comunicação social.
Neste trabalho, o uso do suplemento de ácido graxo combinado ômega-3 e-6 pode fornecer às crianças prematuras um equilíbrio adequado destes ácidos graxos, os quais são importante para o desenvolvimento do cérebro, especialmente o DHA.
Contudo, estudos futuros com um tamanho de amostras maiores por um período maior ajudarão a esclarecer o impacto de ambos os ácidos graxos na questão comportamental associada ao TEA. Tais estudos poderão replicar as descobertas apresentadas aqui, assim como poderão explorar as vias envolvidas que estes ácidos graxos podem atuar para o desenvolvimento cerebral.
Referências:
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