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GLP-1 na Obesidade: A Importância do Monitoramento da Deficiência de B12

 

 

A obesidade é uma doença crônica, complexa e multifatorial, caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal, que compromete a saúde e aumenta o risco de desenvolver distúrbios metabólicos, como diabetes mellitus tipo 2 (DM2), hipertensão arterial e doenças cardiovasculares (DCV).1 Seguindo a tendência epidemiológica global, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam que essa condição já afeta um quarto da população adulta no Brasil, e, com o avanço acelerado, projeções apontam que, até 2035, 40% da população brasileira poderá ser acometida pela obesidade.2

 

A obesidade está frequentemente associada a deficiências em micronutrientes essenciais, incluindo a vitamina B12, apesar do consumo excessivo de calorias. Esse paradoxo de estar "superalimentado, mas subnutrido" é atribuído à má alimentação e à sobrecarga de macronutrientes, como glicose e ácidos graxos, que podem intensificar as respostas inflamatórias e contribuir para a resistência à insulina.3

 

Recentemente, foi publicada a "Atualização 2024 e Posicionamento de Especialistas" da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (ABESO) e da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), abordando o tratamento farmacológico da obesidade em adultos e seu impacto nas comorbidades associadas. Entre os seis tratamentos farmacológicos destacados, merecem atenção especial os miméticos de incretina, como a Liraglutida, a Semaglutida e a Tirzepatida.2

 

Incretinas são hormônios secretados pelas células enteroendócrinas em resposta à ingestão de nutrientes, e têm a função de estimular a secreção de insulina pelas células β de forma dependente da glicose. O peptídeo insulinotrópico dependente de glicose (GIP) e o peptídeo semelhante ao glucagon-1 (GLP-1) são as duas principais incretinas conhecidas (figura 1). A desregulação na secreção e ação dessas incretinas é observada em condições como obesidade e diabetes.4

 

 

Figura 1: Principais ações dos hormônios intestinais do tipo incretinas GLP-1 e GIP que propiciam a diminuição da glicemia (ASCENSO ROSA, 2022).5

 

A semaglutida e a liraglutida são agonistas do receptor GLP-1, uma incretina liberada pelas células L do intestino distal após a ingestão de alimentos. Estes peptídeos se ligam a receptores acoplados à proteína G, ativando uma série de mecanismos que promovem a secreção de insulina dependente de glicose, reduzem a secreção de glucagon, estimulam a lipólise, retardam o esvaziamento gástrico e aumentam a saciedade, contribuindo assim para a perda de peso. Além disso, o GLP-1 desempenha um papel crucial na preservação e proliferação das células beta do pâncreas, responsáveis pela produção de insulina.6

 

A tirzepatida é o primeiro agonista dual dos receptores de polipeptídeo insulinotrópico dependente de glicose (GIP) e GLP-1, com alta seletividade e afinidade por ambos os receptores humanos. Sua atividade no receptor GIP assemelha-se à do hormônio natural GIP, enquanto sua atuação no receptor GLP-1, embora eficaz, é ligeiramente inferior à do GLP-1 endógeno. A tirzepatida aumenta a sensibilidade das células β à glicose, estimulando a secreção de insulina tanto na primeira quanto na segunda fase, além de reduzir os níveis de glucagon, ambos de maneira dependente da glicose. No Brasil, é indicada como adjuvante à dieta e exercício físico para melhorar o controle glicêmico em adultos com diabetes mellitus tipo 2 (DM2). Além do controle glicêmico, estudos demonstram que a tirzepatida também promove uma expressiva redução do peso corporal.7,8

 

Frente ao aumento da prevalência da obesidade e a ampla utilização destes medicamentos, com considerável potencial de perda de peso, é crucial monitorar a deficiência de micronutrientes essenciais, como a vitamina B12, nestes pacientes. O uso destes novos medicamentos (liraglutida, semaglutida e tirzepatida), com consequente redução do apetite e lentificação do esvaziamento gástrico, podem desencadear ou até agravar as deficiências nutricionais, uma vez que a ingesta alimentar estará consideravelmente reduzida e, na maioria das vezes, a dieta não será equilibrada (a maior palatabilidade de alimentos ricos em gorduras e carboidratos contribui para o desequilíbrio habitualmente visto na população). Portanto, é fundamental realizar um monitoramento regular e uma avaliação detalhada dos níveis de micronutrientes para garantir que a terapia seja eficaz na gestão do peso e, ao mesmo tempo, que previna deficiências nutricionais que possam comprometer a saúde global do paciente.

 

 

Referências

  1. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Obesity and overweight. Disponível em: https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/obesity-and-overweight. Acesso em: 17 set. 2024.
  2. Posicionamento ABESO-SBEM sobre Tratamento Farmacológico da Obesidade. 2024. Disponível em: https://abeso.org.br/wp-content/uploads/2024/08/Posicionamento-ABESO-SBEM_Trata-mento-Farmacologico-24JUL24.pdf. Acesso em: 17 set. 2024.
  3. Astrup A, Bügel S. Overfed but undernourished: recognizing nutritional inadequacies/deficiencies in patients with overweight or obesity. Int J Obes (Lond). 2019 Feb;43(2):219-232.
  4. Chia CW, Egan JM. Incretins in obesity and diabetes. Ann N Y Acad Sci. 2020 Feb;1461(1):104-126. 
  5. Ascenso rosa. Tratamento do Diabetes Mellitus. Rev Saúde Foco [Internet]. 2022 jan-abr;9(1):82-105.
  6. Grover-Páez F, Maya Gómez A, Hernández Suárez A, Martínez Echauri A. From a glycocentric approach in the patient with type 2 diabetes mellitus to a multi-organ prevention treatment and a decrease in the neuro-nephro-cardiovascular outcomes. In: Type 2 Diabetes - From Diagnosis to Effective Management [Working Title]. October 2023. DOI: 10.5772/intechopen.1002363.
  7. ELI LILLY AND COMPANY. Tirzepatide (Mounjaro™) Healthcare Professional Information. Disponível em: https://assets.ctfassets.net/fhvti7ztpwfk/2nz2d9ZCVoboA3GlbnzXkQ/397f1f38b299f23719442e6333ac6e6a/PS1506_PS1495_PS1484_PS1471_PS1460_PS1457_LIT_HCP_15Sep23_PTC_clean.pdf. Acesso em: 23 set. 2024.
  8. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Mounjaro® (Tirzepatida) – Novo Registro. Disponível em: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/medicamentos/novos-medicamentos-e-indicacoes/mounjaro-r-tirzepatida-novo-registro. Acesso em: 23 set. 2024.

 

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