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Atualização sobre o extrato de Cranberry Pacran®

Vostalova J, et al., (2015)5 publicaram um estudo randomizado, duplo-cego, paralelo em que foram selecionadas mulheres com mais de 18 anos de idade e com histórico médico de pelo menos dois episódios de ITUs sintomáticas nos últimos 12 meses. O principal objetivo do estudo foi avaliar se uma dose diária de 500mg de extrato de cranberry em pó poderia prevenir ITUs. As participantes foram randomizadas para um grupo de cranberry (N = 89) com 500mg de cranberry (2,8mg PAC/DMAC) ou placebo (N = 93) com seguimento de 6 meses. As curvas de incidência cumulativa dos grupos estão representadas abaixo (figura 2). Resultados mostram que, entre as mulheres do grupo cranberry, 10% (estimativa de Kaplan–Meier) tiveram um episódio de ITU em 133 dias, enquanto no grupo placebo o tempo foi reduzido para 65 dias, apontando um fator protetor para o uso de cranberry. Durante a intervenção, a proporção de mulheres com pelo menos um episódio de ITU foi significativamente menor no grupo cranberry (9/83, 10,84%) do que no grupo placebo (24/93, 25,81%) (p = 0,04), correspondendo a uma redução de risco relativo de 58% no grupo de tratamento em relação ao controle.

    

Figura 1: Curvas de Kaplan-Meier de sobrevivência à recorrência de ITU para os grupos placebo e cranberry.

Sengupta K, et al., (2011)6 apresentou um ensaio clínico randomizado, prospectivo, duplo-cego, a fim de avaliar a eficácia e segurança do pó de cranberry na redução das recorrências de ITU sintomática em indivíduos com cultura positiva. As participantes do estudo foram distribuídas em três grupos, um grupo de tratamento de dose baixa (7,5 mg de PAC/HPLC por dia, N=21) e de dose alta (15 mg de PAC/HLPC por dia, N=23) de proantocianidinas de cranberry, que foram comparadas a um grupo de controle não tratado (N=16). As intervenções foram mantidas por 3 meses, com avaliações clínicas e laboratoriais (incluindo urocultura) seriadas. Ao final, houve uma redução significativa (p<0.0001 e p=0.0151) nos indivíduos positivos para E. coli em ambos os grupos de tratamento em comparação com a avaliação inicial (figura 3), além dos relatos de alívio sintomático, na qual não foi relatado pelas participantes do grupo controle. Não houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos que utilizaram dose baixa ou dose alta de PAC, sugerindo que a quantia de 7,5mg PAC por dia é suficiente e não inferior a 15mg PAC por dia para o desfecho avaliado.

Figura 2: Diferença percentual em indivíduos positivos para E. coli nos grupos de controle e tratamento na avaliação de 10, 30, 60 e 90 dias vs. avaliação inicial.

Alguns estudos in vitro/ex-vivo apontam diferença entre diferentes doses PAC, como o conduzido por Howell, et al., (2010)7. No entanto, o número limitado de participantes (N=32), o desenho em cross-over e o uso de bactérias externas geneticamente modificadas são restritos a um desfecho laboratorial, impossibilitando a extrapolação de seus resultados para um contexto clínico.

A tentativa de comprovação clínica dos achados de Howell2010 foi conduzida por Babar A, et al., (2021)8. Através de um ensaio clínico prospectivo, paralelo, randomizado e duplo cego com 145 mulheres adultas com histórico de infecção recorrente do trato urinário, o objetivo do estudo foi avaliar a superioridade de um extrato de cranberry com altas doses PAC perante um extrato padronizado de cranberry mais utilizado comercialmente na prevenção de infecções recorrentes do trato urinário. As participantes foram randomizadas para receber uma dose alta de proantocianidinas de cranberry (2 x 18,5 = 37mg/DMAC por dia), (N = 72) ou uma dose baixa de controle (2 x 1 = 2mg/DMAC por dia), (N = 73) durante um período de 24 semanas. Após o seguimento de 6 meses, a taxa anualizada de infecções urinarias foi semelhante entre os grupos, sem diferença estatisticamente significativa (IC 0,51-1,11/p=0,16). O cálculo ajustado por idade também não encontrou diferença entre os grupos (IC 0,57-1,26/p=0,42). Os resultados estão representados na Tabela 1 abaixo.

Tabela 1: Incidência de ITU sintomática em 24 semanas por braço do estudo

Por fim, a revisão sistemática mais recente sobre o assunto foi publicada pela conceituada revista Cochrane, em sua sexta avaliação sobre o tema. Nela Williams G, et al., (2023)9 incluíram 50 estudos de cranberry com o total 8857 participantes (26 novos trabalhos em relação a revisão Cochrane anterior). Os ensaios clínicos que utilizaram Pacran® (Vostalova2015 e Sengupta2011), assim como o estudo de altas e baixas doses de Babar2021 foram incluídos na revisão, enquanto o estudo de Howell2010 foi excluído por não apresentar desfecho clínico relevante.

Os autores chegaram à alteração de recomendação em relação às revisões anteriores, opinando favoravelmente ao uso do fruto para prevenção de infecções urinárias. A redução do risco geral de recorrência encontrada foi de 30% (RR 0.70, 95% CI 0.58 to 0.84; I² = 69%) para o desfecho de ITU sintomática controlada por cultura e de 27% (RR 0.73, 95% CI 0.57 to 0.94; i² = 52%) para o desfecho de ITU sintomática não controlada por cultura. Os subgrupos de mulheres com ITU de repetição, crianças e pessoas submetidas a procedimentos cirúrgicos que envolvam o trato urinário apresentam melhor evidência da intervenção.

Os pesquisadores da Cochrane2023 também realizaram subanálises (figuras 4, 5 e 6) sobre quantidade de proantocianidinas (PAC) necessária para o efeito protetor, reunindo os estudos de Sengupta2011 (7,5 vs 15mg PAC), Wing2008 (106 vs 318mg PAC), Juhani2010 (16 vs 32mg PAC) e Babar2021 (2 vs 36mg PAC). Em todos os trabalhos levantados, não foi encontrada diferença significativa de risco para ITU com o uso de pequenas, moderadas ou grandes concentrações de PACs, conforme demonstrado nas imagens abaixo:


Figura 3: Análise 5.1 Dose de cranberry: alta versus baixa, Resultado 1: ITU sintomática: ITU verificada por cultura


Figura 4: Análise 5.2 Dose de cranberry: alta versus baixa, Resultado 2: ITU microbiológica: cultura positiva sem sintomas conhecidos


Figura 5: Análise 5.3 Dose de cranberry: alta versus baixa, Resultado 3: ITU clínica sem verificação de cultura

Por fim o resumo das evidências atuais apoia o uso de cranberry como um agente efetivo para redução de infecção urinaria recorrente. O uso de extratos padronizados, clinicamente testados, pode ser uma interessante opção de intervenção. Alternativas com altas concentrações de PAC podem não ser custo-efetivas, visto que não há comprovação clínica de sua superioridade.

Dados mais recentes

Um estudo duplo cego randomizado e multicêntrico, publicado no The American Journal of Clinical Nutrition em 20256 também teve como objetivo estudar os efeitos do Cranberry em mulheres com histórico de ITUs de repetição. Foram incluídas mulheres com 3 ou mais episódios de ITU em um ano, e 2 ou menos episódios em 6 meses. Neste estudo, 150 participantes foram randomizadas para um grupo que receberia cápsulas de Cranberry em pó na forma de cápsulas, na dose de 500mg/dia, ou para um grupo placebo. Foram realizadas coletas de urocultura no início do estudo, e após aos 3 a 6 meses de acompanhamento, além de qualquer momento em que as pacientes tivessem sintomas urinários. Os autores concluíram que o cranberry foi capaz de reduzir o risco de ITU em 52%, sendo capaz ainda de reduzir o risco de UTIs fortemente sintomáticas (com polaciúria e urgência miccional) em até 71%. Além disso, não foram observados eventos adversos significativos.

Uma metanálise recente publicada na conceituada revista JAMA concluiu que os produtos à base de cranberry reduzem o risco de ITU em até 54% em crianças, em pessoas suscetíveis após tratamentos urológicos em 53% e em mulheres com ITUs recorrentes em até 26%. Os dados sugerem que idosos institucionalizados, gestantes e adultos com patologias urológicas podem não se beneficiar destes produtos.7

A American Urological Association (AUA, 2019) menciona o cranberry como terapia não antibiótica aceitável para prevenção de ITU recorrente feminina, especialmente a forma em suco ou suplemento padronizado8

Tabela Comparativa de Estudos Clínicos com Cranberry

Autor principal

Ano

Nº de pacientes

Metodologia

Intervenção

Desfechos/Resultados

Sengupta K

2011

60

Ensaio clínico randomizado, duplo-cego, controlado por dose e placebo

Cranberry com 7,5 mg ou 15 mg PAC/HPLC por dia

Redução significativa de E. coli (p<0,0001 e p=0,0151); sem diferença entre doses

Vostalova J

2015

172

Ensaio clínico randomizado, duplo-cego, paralelo

500 mg/dia de cranberry (2,8 mg PAC/DMAC) em cápsulas

Redução de 58% no risco relativo de ITU recorrente (p=0,04)

Babar A

2021

145

Ensaio clínico randomizado, duplo-cego, paralelo

37 mg PAC/DMAC vs 2 mg PAC/DMAC por dia

Sem diferença estatística entre grupos (p=0,16); ITU semelhante em ambos

Stonehouse W

2025

150

Ensaio clínico multicêntrico, randomizado, duplo-cego, controlado por placebo

Suplemento de cranberry em pó integral por 6 meses

Redução significativa na incidência de ITU com cultura positiva

Referências bibliográficas

  1. Vostalova J, Vidlar A, Simanek V, Galandakova A, Kosina P, Vacek J, Vrbkova J, Zimmermann BF, Ulrichova J, Student V. Are High Proanthocyanidins Key to Cranberry Efficacy in the Prevention of Recurrent Urinary Tract Infection? Phytother Res. 2015 Oct;29(10):1559-67.
  2. Sengupta K, Alluri KV, Golakoti T, Gottumukkala GV, Raavi J, Kotchrlakota L, Sigalan SC, Dey D, Ghosh S, Chatterjee A. A Randomized, Double Blind, Controlled, Dose Dependent Clinical Trial to Evaluate the Efficacy of a Proanthocyanidin Standardized Whole Cranberry (Vaccinium macrocarpon) Powder on Infections of the Urinary Tract. Current Bioactive Compounds. 2011;7:39-46.
  3. Howell AB, Botto H, Combescure C, Blanc-Potard AB, Gausa L, Matsumoto T, Tenke P, Sotto A, Lavigne JP. Dosage effect on uropathogenic Escherichia coli anti-adhesion activity in urine following consumption of cranberry powder standardized for proanthocyanidin content: a multicentric randomized double blind study. BMC Infect Dis. 2010 Apr 14;10:94.
  4. Babar A, Moore L, Leblanc V, Dudonné S, Desjardins Y, Lemieux S, Bochard V, Guyonnet D, Dodin S. High dose versus low dose standardized cranberry proanthocyanidin extract for the prevention of recurrent urinary tract infection in healthy women: a double-blind randomized controlled trial. BMC Urol. 2021 Mar 23;21(1):44.
  5. Williams G, Stothart CI, Hahn D, Stephens JH, Craig JC, Hodson EM. Cranberries for preventing urinary tract infections. Cochrane Database Syst Rev. 2023 Nov 10;11(11):CD001321
  6. Stonehouse W, Benassi-Evans B, Bednarz J, Vincent AD. Whole cranberry fruit powder supplement reduces the incidence of culture-confirmed urinary tract infections in females with a history of recurrent urinary tract infection: A 6-month multicenter, randomized, double-blind, placebo-controlled trial. Am J Clin Nutr. 2025 Apr;121(4):932-941. doi: 10.1016/j.ajcnut.2025.01.022. Epub 2025 Jan 23. PMID: 39863114; PMCID: PMC12002188.
  7. Harris E. Updated Meta-analysis: Cranberry Products Reduced UTI Risk. 2023 May 23;329(20):1730. doi: 10.1001/jama.2023.7761. PMID: 37133890.
  8. Anger J, Lee U, Ackerman AL, Chou R, Chughtai B, Clemens JQ, et al. Recurrent uncomplicated urinary tract infections in women: AUA/CUA/SUFU guideline. American Urological Association; 2019. Available from: https://www.auanet.org/documents/Guidelines/PDF/rUTI-guideline.pdf
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