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Alergia à Proteína do Leite de Vaca

A alergia às proteínas do leite de vaca é o resultado de uma resposta imunológica anormal a esses componentes do leite. Os mecanismos para essa resposta podem ser mediados ou não pela imunoglobulina E, ou ainda ser mecanismos mistos.1 As proteínas envolvidas na alergia ao leite de vaca são as caseínas, a a e a b-lactoglobulina e a albumina sérica, havendo risco de reatividade cruzada para o leite de cabra (92%) e a carne bovina (10%). A presença de IgE específica para esses componentes pode indicar persistência da alergia.2

Alergia às proteínas ou intolerância à lactose?
A alergia às proteínas do leite de vaca é frequentemente confundida com a intolerância à lactose. Os dois transtornos, entretanto, são diferentes.3 Não há uma “alergia à lactose”, pela falta de especificidade do composto – ele é igual em todos os tipos de leite – e pelo fato de ele não ser uma proteína.3
Alergia às proteínas do leite de vaca Intolerância à lactose

- Reação alérgica às proteínas do leite;3

- Necessidade de exclusão completa do alimento.4

- Incapacidade de digestão do açúcar do leite – a lactose –, pela ausência parcial ou completa de produção da enzima lactase;3

-  Efeitos gastrointestinais pela fermentação da lactose não digerida acumulada no intestino.3

 

EPIDEMIOLOGIA

No Brasil, os dados sobre prevalência de alergia alimentar são escassos e limitados a grupos populacionais. Estudo realizado por gastroenterologistas pediátricos apontou incidência de 2,2% e prevalência de 5,4% em crianças. Menos de 10% dos casos de alergia alimentar persistem até a vida adulta.5

A alergia ao leite de vaca tem seu pico de incidência aos 3 meses de idade e é raramente observada após os 6 meses de idade. Sua incidência é significativamente menor em crianças exclusivamente amamentadas, com taxas de 0,5% a 1%, já que a concentração das proteínas alergênicas no leite materno é 100.000 vezes menor do que a encontrada nas fórmulas.3  

 

DIAGNÓSTICO

O primeiro passo para o diagnóstico da alergia ao leite de vaca é a obtenção do histórico médico completo e um exame físico cuidadoso. Se as características apresentadas na tabela 1 não puderem ser explicadas por outra causa, a alergia às proteínas do leite de vaca pode ser considerada como diagnóstico potencial. O diagnóstico da alergia, na maioria dos casos, precisa ser confirmado ou excluído por um teste de eliminação e desafio.6 

Outras ferramentas de apoio são o prick test e o patch test.1

De maneira geral, o diagnóstico diferencial das reações adversas a alimentos envolve doenças gastrointestinais que causam vômito e/ou diarreia, contato com contaminantes e aditivos, uso de medicamentos e reações psicológicas.5

 

Sistema Sinais e sintomas Reação imediata*
Digestivo Disfagia, regurgitação frequente, cólica, dor abdominal, vômitos, anorexia, diarreia com ou sem perda de proteínas intestinais ou sangue; constipação com ou sem rash perianal; atraso de crescimento; sangue oculto nas fezes; anemia ferropriva Vômitos
Respiratório Coriza, chiado, tosse crônica; todos sem relação com infecções Chiado ou estridor, dificuldade respiratória
Cutâneo Urticária (não relacionada a infecções, uso de medicamentos ou outras causas), eczema atópico, angioedema Urticária, angioedema
Geral Anafilaxia, sintomas de choque com acidose metabólica grave, vômitos e diarreia (FPIES) Anafilaxia, FPIES

FPIES: síndrome de enterocolite induzida por proteínas alimentares. *De minutos a duas horas da ingestão da proteína do leite de vaca.

Tabela 1. Sinais e sintomas da alergia às proteínas do leite de vaca

Adaptada de: Koletzko S, et al. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2012 Aug;55(2):221-9.6

 

TRATAMENTO

A dieta de exclusão é a conduta de escolha para controle das manifestações da alergia ao leite de vaca.5 Após a recuperação clínica e nutricional do paciente, o teste de provocação oral deve confirmar o diagnóstico, e uma dieta terapêutica de exclusão deve ser estabelecida até o desenvolvimento da tolerância oral.1

Os produtos lácteos são responsáveis por >50% da ingestão de cálcio e vitamina D em crianças. A dieta de exclusão aumenta o risco de inadequação do consumo de nutrientes e torna necessária a suplementação de cálcio e vitamina D quando não são alcançados os requerimentos de ingestão diária.5,7

Crianças com alergia ao leite de vaca persistente apresentam menor densidade mineral óssea e ingestão de cálcio, quando comparadas com crianças sem alergia; entretanto, menos de metade das crianças alérgicas usam suplementos de cálcio e vitamina D, apesar de a adesão ao tratamento já ter sido relatada como sendo alta (5,5 dias por semana).7

Já para crianças exclusivamente amamentadas, ao se retirar a proteína do leite da dieta da mãe, esta deve receber 1 g de cálcio e 600 UI de vitamina D por dia.1

 

PREVENÇÃO

As diretrizes para a prevenção primária de alergia às proteínas do leite da American Academy of Allergy, Asthma, and Immunology, do American College of Allergy, Asthma and Immunology e da Canadian Society of Allergy and Clinical Immunology recomendam que não haja o atraso deliberado da introdução do leite de vaca na dieta da criança após a introdução dos alimentos sólidos, ao redor de 6 meses de idade.8 (nível de evidência moderado; força da recomendação: A/B)

Os possíveis fatores envolvidos na patogênese da alergia às proteínas do leite de vaca estão na figura 2.

 

Figura 1. Possíveis fatores envolvidos na patogênese da alergia ao leite de vaca

Adaptada de: Abrams EM, Sicherer SH. Ann Allergy Asthma Immunol. 2021 Jul;127(1):36-41.8

 

Referências

  1. Toca MC, Morais MB, Vázquez-Frias R, Becker-Cuevas DJ, Boggio-Marzet CG, Delgado-Carbajal L, et al.; the Food Allergy Working Group of the Latin American Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology and Nutrition. Consensus on the diagnosis and treatment of cow's milk protein allergy of the Latin American Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology and Nutrition. Rev Gastroenterol Mex (Engl Ed). 2022 Apr-Jun;87(2):235-50.
  2. Solé D, Silva LR, Cocco RR, Ferreira CT, Sarni RO, Oliveira LC, et al. Consenso Brasileiro sobre Alergia Alimentar: 2018 - Parte 1 - Etiopatogenia, clínica e diagnóstico. Documento conjunto elaborado pela Sociedade Brasileira de Pediatria e Associação Brasileira de Alergia e Imunologia. Arq Asma Alerg Imunol. 2018;2(1):7-38.
  3. Rangel AHN, Sales DC, Urbano SA, Galvão Júnior JGB, Andrade Neto JC, Macêdo C S. Lactose intolerance and cow's milk protein allergy. Food Sci Technol. 2016 Apr;36(2):179-87.
  4. Darwin AH, Carroll MP, Galvis Noda SD, Perez Perez SF, Mhaskara RS, Spoto-Cannons AC, et al. Calcium and vitamin D intake in allergic versus non-allergic children and corresponding parental attitudes towards dairy products. World Allergy Organ J. 2021 Sep 23;14(9):100579.
  5. Solé D, Silva LR, Cocco RR, Ferreira CT, Sarni RO, Oliveira LC, et al. Consenso Brasileiro sobre Alergia Alimentar: 2018 - Parte 2 - Diagnóstico, tratamento e prevenção. Documento conjunto elaborado pela Sociedade Brasileira de Pediatria e Associação Brasileira de Alergia e Imunologia. Arq Asma Alerg Imunol. 2018;2(1):39-82.
  6. Koletzko S, Niggemann B, Arato A, Dias JA, Heuschkel R, Husby S, et al.; European Society of Pediatric Gastroenterology, Hepatology, and Nutrition. Diagnostic approach and management of cow's-milk protein allergy in infants and children: ESPGHAN GI Committee practical guidelines. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2012 Aug;55(2):221-9.
  7. Mailhot G, Perrone V, Alos N, Dubois J, Delvin E, Paradis L, et al. Cow's Milk Allergy and Bone Mineral Density in Prepubertal Children. 2016 May;137(5):e20151742. Abrams EM, Sicherer SH. Cow's milk allergy prevention. Ann Allergy Asthma Immunol. 2021Jul;127(1):36-41. 

 

 

 

 

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