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A importância dos folatos para a gestação

Os folatos estão presentes em quase todos os alimentos naturais de origem animal e vegetal e são encontrados principalmente na forma de poliglutamatos

Quando os folatos são oxidados, por exemplo, no cozimento de vegetais folhosos, eles se transformam em ácido fólico. A estrutura do ácido fólico consiste na associação de três importantes moléculas: aminopterina, ácido para-aminobenzoico e ácido glutâmico. 

A maioria dos folatos naturalmente tem uma cadeia lateral de 3 a 11 resíduos de glutamato com ligação peptídica. Aproximadamente 80% do folato alimentar existe na forma de poliglutamatos. Durante o transporte gastrointestinal, os poliglutamatos são hidrolisados a monoglutamatos, reduzidos e metilados.

Os folatos, por serem predominantemente poliglutamatos, necessitam ser hidrolisados para monoglutamatos para ser absorvidos no intestino delgado. Esse processo ocorre em um pH ótimo entre 6 e 7, portanto alimentos que alteram o pH intestinal podem acarretar uma incompleta desconjugação do poliglutamato e, consequentemente, a diminuição da sua biodisponibilidade.


O ácido fólico, cuja nomenclatura química é ácido pteroilmonoglutâmico, foi inicialmente descrito em 1945.

Quinze anos antes dessa descoberta, já havia sido descrita a existência de um novo fator hematopoiético em leveduras e extratos de fígado, que teria a capacidade de curar a anemia macrocítica tropical da Índia.

O ácido fólico, conhecido popularmente como vitamina B9, é hidrossolúvel, não existe em forma natural e não tem atividade biológica, precisando ser convertido em diidrofolato (DHF), tetrahidrofolato (THF) e, finalmente, metilfolato (MTHF), para que este último seja biologicamente ativo.

O ácido fólico é altamente suscetível à oxidação, ao congelamento, ao aquecimento e ao cozimento, havendo perdas de 50% a 95% do conteúdo alimentar do folato durante esses processos. Durante o assamento de pães confeccionados com farinhas enriquecidas em laboratório, ocorre degradação do ácido fólico em torno de 26%.

Em 1941, para purificar o fator extrínseco descoberto no fígado capaz de curar a anemia macrocítica tropical da Índia – causada por deficiência de vitamina B12 –, foi obtido outro fator presente nas folhas de espinafre que não era eficaz no tratamento desse tipo de anemia, mas era responsável pela estimulação do crescimento de Streptococcus lactis; para esse desconhecido fator, foi utilizada a nomenclatura de ácido fólico, cujo termo deriva do latim folium, folha, devido à sua presença em vegetais predominantemente folhosos.

Na primeira metade do século XX, identificou-se a síntese das formas de ácido fólico para o tratamento de deficiências nutricionais e da anemia macrocítica, enquanto na segunda metade houve a descoberta das vias de absorção e metabolismo dessa vitamina e suas possíveis relações com outras doenças, tais como câncer, doenças cardiovasculares e defeitos congênitos. Publicações a partir da década de 1990 mostraram que o aumento dos níveis de homocisteína está associado ao defeito congênito do tubo neural e, em 1993, o governo norte-americano passou a recomendar a ingestão diária adequada de folato para todas as mulheres em idade fértil, para reduzir o risco de malformações fetais de espinha bífida e outros defeitos do tubo neural.

Os alimentos com maior conteúdo de folatos são as verduras e hortaliças, os cereais e as frutas, cujos valores de folatos variam entre 20 e 160 μg/100 g. Os alimentos de origem animal, de forma geral, apresentam baixos teores dessa vitamina, com exceção de fígado, que apresenta altas concentrações (700 a 1.400 μg/100 g).



Os folatos atuam como coenzimas, mediando a transferência de unidades de carbono, podendo agir como aceptores ou doadores de unidades de carbono em uma variedade de reações críticas para o metabolismo de ácidos nucleicos e aminoácidos. Participam de dois processos biológicos fundamentais: atuam como cofator para as enzimas implicadas na biossíntese de ácido ribonucleico (RNA) e ácido desoxirribonucleico (DNA) e como cofator na formação da metionina.

A partir de junho de 2002, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária publicou na Consulta Pública nº 51, a qual se tornou a Resolução RDC nº 344 a partir de dezembro do mesmo ano, a exigência de fortificação de farinhas de trigo e de milho e seus subprodutos com ácido fólico, devendo cada 100 g do produto fornecer uma quantidade mínima de 150 mcg da vitamina.

Estudos demonstraram que 70% dos casos de defeitos do tubo neural podem ser evitados com a suplementação do ácido fólico.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) reconheceu, em 2004, que as deficiências de micronutrientes são comuns entre as mulheres em idade reprodutiva e que a ingestão de folato na dieta é insuficiente na população geral, sendo improvável que modificações nos padrões alimentares melhorem o estado do folato sanguíneo nas populações-alvo.

Gestantes com mutação da enzima MTHFR e hiper-homocisteinemia apresentam maior risco de perdas fetais recorrentes. Uma característica central do desenvolvimento embrionário e fetal é a divisão celular generalizada, sendo o folato central devido ao seu papel na síntese de ácidos nucleicos.

Durante a gestação, o aporte inadequado de folato prejudica a divisão celular no feto ou na placenta. A deficiência de folato pode ocorrer porque a ingestão na dieta é baixa ou o requerimento metabólico é aumentado por defeitos genéticos específicos, como a mutação da MTHFR. Durante a gravidez, baixas concentrações de folato alimentar e circulante estão associadas ao aumento do risco de parto prematuro, baixo peso ao nascer e retardo do crescimento fetal.

Um efeito metabólico da deficiência de folato é a elevação da homocisteína no sangue.

Da mesma forma, a presença de concentrações maternas aumentadas de homocisteína foi associada ao aborto espontâneo habitual e às complicações da gravidez, como desprendimento placentário e pré-eclâmpsia, o que aumenta o risco de desfecho ruim de gravidez e a diminuição da duração da gravidez.5 A mutação da MTHFR está relacionada a aumento no risco de autismo, esquizofrenia, doença cardíaca, defeitos do tubo neural fetal e câncer colorretal. Além disso, a deficiência de folato pode causar glossite, diarreia, lesões gastrointestinais e anemia.

O funcionamento adequado da enzima MTHFR é importante para a conversão de 5,10-metilenotetraidrofolato em 5-metiltetraidrofolato (L-metilfolato), que é a principal forma de folato circulante no sangue.

O L-metilfolato está envolvido na recuperação de homocisteína em metionina, com diminuição dos níveis de homocisteína e a doação de radicais metil, etapa essencial para a metilação das cadeias de DNA, processo conhecido como via do carbono único.

Sendo assim, o não funcionamento adequado da MTHFR, em seus dois polimorfismos, pode cursar com hiper-homocisteinemia. Existem dois polimorfismos da MTHFR predominantes: C677T e A1298C.7,8 A mutação do gene em heterozigose ou atinge cerca de 40% da população europeia e 50% da brasileira.

As mulheres com mutação da MTHFR têm redução na velocidade de conversão do 5,10-metileno- THF em metilfolato (5-MTHF). Aquelas com a mutação MTHFR 677CT (heterozigose) têm 65% da atividade do genótipo 677CC (genótipo normal), aquelas com MTHFR 677TT (homozigose) têm 30% da atividade do genótipo 677CC (genótipo normal), o que faz com que a administração do metilfolato, que é o princípio ativo, não sofra os efeitos deletérios da mutação da MTHFR, por não necessitar da conversão enzimática.

O bypass que a administração do metilfolato faz pela MTHFR talvez explique por que sua administração em mulheres com a mutação da MTHFR proporcione níveis séricos de folato em velocidade superior aos mesmos níveis adquiridos pela administração de ácido fólico.11  (Figura 2) O folato é uma vitamina necessária em doses adequadas durante a gravidez, exercendo papel importante na prevenção e recorrência de defeitos do tubo neural (anencefalia e espinha bífida).

Além da prevenção de defeitos do tubo neural, a suplementação periconcepcional com ácido fólico é benéfica na prevenção de cardiopatia congênita, lábio leporino e parto prematuro. O mecanismo pelo qual o ácido fólico evita anormalidades estruturais no feto não é conhecido, mas pode envolver regulação do metabolismo da homocisteína.

O metilfolato, por ser a forma biologicamente ativa dos folatos, diferentemente do ácido fólico, não é tóxico quando ingerido acima da dose recomendada. Além disso, o uso de metilfolato pelas gestantes não mascara a deficiência de vitamina B12.

Quando administrado via oral, o metilfolato atinge um nível sérico maior que o nível atingido pela ingesta de ácido fólico, mesmo em mulheres com mutação da MTHFR.4,12,13

Sendo assim, a suplementação com L-MTHF permite maior disponibilidade do composto, já que este não depende de enzimas para metabolização, diferente do ácido fólico, cuja cadeia de metabolização para a forma ativa é longa.

Desse modo, mulheres com deficiência de MTHFR podem beneficiar-se da suplementação com L-MTHF e não com ácido fólico.

Não se recomenda a pesquisa da mutação desse gene de rotina para todas as mulheres, já que nem sempre são identificadas.

Referências bibliográficas:

 Vannucchi H, Monteiro TH.

ginecologiaácidofolico ginecologia e obstetricia