Nos últimos anos, a compreensão sobre a importância da vitamina D para a saúde infantil passou por grandes evoluções, refletidas nas mudanças das diretrizes de sociedades médicas ao redor do mundo, incluindo a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Comparando as orientações de 2016 e 2024¹ ², observamos um avanço significativo nas recomendações, que agora são mais abrangentes e baseadas em novas evidências científicas.
Em 2016, as orientações da SBP focavam principalmente na prevenção da deficiência de vitamina D em crianças e adolescentes, especialmente em lactentes, que têm um risco maior de desenvolver hipovitaminose D devido aos baixos níveis desse nutriente no leite materno. Naquela época, a meta era manter níveis séricos de vitamina D acima de 20 ng/mL, com suplementação sendo recomendada de acordo com a faixa etária e condições específicas, como prematuridade ou doenças crônicas.
Entretanto, com o avanço das pesquisas, ficou claro que a manutenção de níveis mais altos de vitamina D pode trazer benefícios adicionais, não apenas para a saúde óssea, mas também para o fortalecimento do sistema imunológico e a prevenção de várias doenças. Assim, as novas diretrizes da SBP, publicadas em 2024, elevaram o patamar ideal de vitamina D para crianças e adolescentes, recomendando que os níveis séricos sejam mantidos acima de 30 ng/mL.
Além disso, as recomendações de 2024 são mais abrangentes, não se limitando apenas a lactentes e crianças pequenas. Agora, há um foco maior também em adolescentes, especialmente aqueles que têm pouca exposição solar ou pertencem a grupos de risco, como aqueles com obesidade, doenças autoimunes ou que fazem uso prolongado de medicamentos que afetam o metabolismo da vitamina D.A suplementação é vista como uma estratégia essencial para esses grupos, visando garantir níveis adequados do nutriente e prevenir complicações futuras.
A SBP recomenda manter os níveis séricos de 25(OH)D acima de 30ng/mL, em consonância com outras sociedades, como a SBEM³. A Endocrine Society4 reforça a importância da suplementação de vitamina D nos pacientes saudáveis (que não façam parte de nenhum grupo de risco para deficiência de vitamina D), não fazendo menção no documento a respeito de níveis séricos recomendados. A suplementação empírica em pacientes até 18 anos visa também a prevenção do raquitismo e a redução de infecções respiratórias.
Parâmetro | SBP 2024 | Endocrine Society Clinical Practice Guideline |
Nível sérico ideal de vitamina D | ≥ 30 ng/ml | não endossa mais um nível específico e ugere contra a triagem de rotina de 25(0H)D |
Foco da suplementação | Saúde óssea, imunidade e prevenção de doenças crônicas | Suplementação empírica para prevenir o raquitismo nutricional e diminuir o risco de infecções do trato respiratório. |
Dose recomendada para lactentes (< 1ano ) |
400-600 UI/dia | 400-1000 UI/dia |
Dose recomendada para crianças ( 1-18 anos) |
600-1000 UI/dia (ajustável para grupos de risco) |
600-1000 UI/dia |
Comparando as recomendações de 2016 e 2024, percebemos mudanças significativas em três aspectos principais: o aumento do nível sérico ideal de vitamina D, a ampliação das populações alvo para a suplementação (incluindo agora adolescentes e grupos de risco ampliados) e ajustes nas doses recomendadas para aqueles com necessidades especiais. Essas mudanças refletem um entendimento mais profundo sobre o papel da vitamina D na saúde pediátrica, indo além da prevenção de raquitismo e fraturas, mas também considerando benefícios imunológicos e metabólicos.
Assim, o consenso atual é que a suplementação de vitamina D deve ser personalizada, levando em conta as necessidades individuais de cada criança ou adolescente, especialmente em contextos em que a exposição solar é limitada. A evolução nas diretrizes da SBP demonstra o compromisso com a promoção de uma saúde infantil mais robusta e adaptada às novas descobertas científicas.
Em suma, a atualização das diretrizes sobre a vitamina D entre 2016 e 2024 mostra que o campo da saúde está em constante evolução. É essencial que pais, pediatras e outros profissionais de saúde estejam atentos a essas mudanças, garantindo que nossas crianças tenham acesso aos benefícios que a ciência tem a oferecer.
Parâmetro | Recomendações de 2016 | Recomendações de 2024 |
Nível sérico ideal de vitamina D |
≥ 20 ng/mL | ≥ 30 ng/mL |
População-alvo | Lactentes, crianças pequenas, grupos de risco |
Lactentes, crianças, adolescentes, grupos de risco ampliados |
Foco da suplementação | Prevenção de raquitismo e hipovitaminose D |
Saúde óssea, imunidade e prevenção de doenças crônicas |
Dose recomendada para lactentes (< 1ano) | 400 UI/dia | 400-600 UI/dia |
Dose recomendada para crianças ( 1-18 anos) |
600 UI/dia | 600-1000 UI/dia (ajustável para grupos de risco) |
Dose recomendada para adolescentes (12-18 anos) |
Não amplamente enfatizada | 800-1000 UI/dia para aqueles com baixa exposição solar |
Grupos de risco adicionais |
Prematuros, crianças com doenças crônicas |
Inclui obesos, uso de medicamentos crônicos, doenças autoimunes |
Suplementação para populações especiais | Doses ajustadas conforme necessidade | Doses individualizadas para adolescentes obesos e condições autoimunes |
Benefícios esperados | Saúde óssea | Saúde óssea, imunidade, prevenção de doenças metabólicas |
Revisão de evidências científicas |
Baseada em dados disponíveis até 2016 | Incorporou novas pesquisas de 2016 a 2024 |
Recomendações da SBP para prevenção da hipovitaminose D em crianças e adolescentes.²
Grupos | Colecalciferol (vitamina D3) | |
Crianças < 1ano | 400 UI/dia | |
Crianças e adolescentes entre 1-18 anos | 600 a 1200 UI/dia | |
Crianças que possuam fatores de risco - Dieta estritamente vegetariana - Obesidade - Hepatopatia, nefropatia crônica - Má absorção intestinal (p. ex., doença celíaca, doença inflamatória intestinal, fibrose cística, cirurgia bariátrica) - Medicamentos (p.ex., anticonvulsivantes corticoides, cetoconazol, rifampicina) |
1200 - 1800 U I/d ia (ajustar dose de acordo com cada condição) |
Referências Bibliográficas:
1. SBP. Sociedade Brasileira de Pediatria. Hipovitaminose D em pediatria: recomendações para o diagnóstico, tratamento e prevenção. Departamento Científico de Endocrinologia e Metabologia. Guia Prático de Atualização. v. 1, p. 11, 2016.
2. SBP. Sociedade Brasileira de Pediatria. Hipovitaminose D em pediatria: diagnóstico, tratamento e prevenção – Atualização –. Departamento Científico de Endocrinologia. 2024.
3.SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA CLÍNICA/ MEDICINA LABORATORIAL (SBPC/ML); SOCIEDADE BRASILEIRA DE ENDOCRINOLOGIA E METABOLOGIA (SBEM). Posicionamento oficial da SBPC/ML e da SBEM sobre intervalos de referência da vitamina D [25(OH)D]. 2017. Disponível em: https://www.endocrino.org.br/media/uploads/PDFs/posicionamentooficial_sbpcml_sbem_-_final_(1).pdf. Acesso em: 19 nov. 2024.
4.Demay MB, Pittas AG, Bikle DD, Diab DL, Kiely ME, Lazaretti-Castro M, Lips P, Mitchell DM, Murad MH, Powers S, Rao SD, Scragg R, Tayek JA, Valent AM, Walsh JME, McCartney CR. Vitamin D for the Prevention of Disease: An Endocrine Society Clinical Practice Guideline. J Clin Endocrinol Metab. 2024 Jun 3:dgae290.